domingo, 28 de abril de 2013

A lenda do desfralde

Hoje, um domingo lindo nascido depois de um sábado exaustivo, seguido de uma semana loucamente cansativa, eu e esposa dormíamos serenamente quando fomos acordadas por um serzinho que sussurrava:
- Mãe, todô!

Laura acordou. Feliz da vida porque finalmente aprendeu a levantar da cama, abrir a porta e sair ao invés de ficar lá sentada como se não andasse, gritando MANHÊÊÊ como se não houvesse amanhã. Sim. Laura teve que ser estimulada a sair do quarto por conta própria, como também teve que ser estimulada a brincar, pular e fazer inúmeras atividades que tantas crianças fazem normalmente. E não estou contando isso para fazer brotar a compaixão no coração da humanidade - odeio compaixão. Falei por que isso talvez dê bases para que entendam como está sendo o processo de desfralde aqui em casa.

Pois bem, antes de ter filhos eu tinha pânico do desfralde. Me apavorava com a ideia de ter uma criança se mijando toda pela casa, me via limpando xixi por todo o canto, tudo fedendo, etc. Mas lá por outubro ou novembro, época em que a Laura entrou na escolinha, deu a louca e tirei a tal da fralda. Então, para quem ainda não se aventurou, aqui vai nosso beabá:

Primeira etapa

Começamos testando a reação dela só em casa e durante o dia. Foi um sucesso no primeiro dia, ela amou ficar sem fraldas e se empolgou total com a dancinha senta e levanta no penico. Inicialmente tive medo de deixá-la curtir o sofá da sala, já que a impermeabilização não funciona para o xixi (oi?). Ficava de minuto a minuto convidando: "vamos fazer xixi filha!" Pegava pela mão a criatura e levava para o penico lá no banheiro, ensinava a tirar a calça, blablabla.
No segundo dia ela concentrou seu ódio no penico. Assim que o viu abriu o maior berreiro, não quis saber de sentar no dito cujo e mandá-la fazer xixi parecia o mesmo que dizer: "filha, vá para a forca e morra". Mesmo assim não teve nenhum vazamento, mesmo contrariadíssima ela fez xixi no penico bem bonitinha.
Nos dias que se seguiram, como o mau humor aumentava, Camila resolveu colocar o penico na sala, assim ficaria mais perto de nós e talvez não se irritasse tanto. Deu super certo, ela fez as pazes com a privadinha e voltou à animação do primeiro dia. Nesse ponto, resolvemos avisar na escola que estávamos mantendo-a sem fralda durante o dia, que se possível dessem continuidade ao trabalho por lá.

Material usado: calcinhas, pano, desinfetante e paciência.
Recursos adicionais: convite para fazer xixi a cada 2 minutos e meio (não eram perguntas, eram CONVITES, creio que faz toda a diferença quando a criança está na fase do NÃO), dancinha do xixi e do cocô feliz, tchau para o xixi, repetição do ritual pós-penico: levanta do penico, limpa a perereca, coloca a calcinha, dá a descarga.
Resultado: nem contabilizei quantos xixis tivemos na calça, mas foram poucos, pouquíssimos, nem cheguei a me irritar.
Tirada de fralda primeira etapa: sucesso total.

Segunda etapa

Como a coisa toda tava uma maravilha, arriscamos tirar a fralda também durante os percursos de carro. Nosso maior medo aqui era que se rolasse uma escapada o trabalho seria triplo - santa paciência tirar a capa daquela cadeirinha para lavar -, sem contar que percorremos com ela longos trajetos cada vez que saímos de casa. Tudo isso fez com que levássemos algumas semanas para criar coragem.
Mas quando o dia chegou, chegou chegando. Tiramos e ela fez direitinho a parte dela. Dois momentos foram cruciais para percebermos de que ela estava mesmo preparada para viver sem fraldas:

1- Um dia eu retornando para casa com ela quando encaro um belo congestionamento. Lá pelas tantas, Laura fala a frase arrepiante "Mãe, té xixi". Olhei para ela disfarçando a tensão e falei: "agora não filha, mas quando a gente chegar em casa você pode fazer xixi ok? (por favor por favor por favor por favor)". Ela: "tá bom!" E cumpriu o combinado, chegamos em casa muitos minutos depois e a calcinha estava seca.

2- Pouco tempo depois de tirarmos a fralda nos trajetos, encaramos uma viagem longa para o RS. Foram 7 horas na ida e 10 horas na volta. Paramos duas vezes em cada etapa, Laura não pediu para parar nenhuma vez e fez xixi somente nos banheiros. Sei que não estava apertada, pois seguiu brincando e se divertindo - e até dormindo - numa boa o caminho todo.

Material usado: calcinhas.
Recursos adicionais: nenhum.
Resultado: Laura nunca fez xixi na cadeirinha, então o resultado não poderia ser melhor.
Tirada de fralda segunda etapa: sucesso total.

Terceira etapa

Quem pegou no sono com tanto tédio agora pode acordar que a ladainha começou rs Depois de meses usando fraldas apenas para dormir, eu e Camila fugindo sempre da conversa enfim decidimos encarar: já era hora de tirar a fralda noturna. Como sempre esquecíamos de comprar aquela capa para forrar o colchão, fomos adiando a data, o que não sei se foi bom. Afinal, Laura muitas vezes deu sinal de que era capaz de segurar o xixi durante a noite - várias manhãs vieram com fralda sequinha. Mas passava o tempo e o xixi voltava a surgir, nos desencorajando a começar a terceira e dolorosa etapa.
Mas como acontece sempre, um belo dia a gente se jogou na coisa: enfiamos um saco de lixo gigante na cama sob o lençol, reduzimos o líquido da noite e fizemos a lição de casa com a pimpolha. Ela já estava sendo adestrada para isso há um tempinho, mas o lance foi mais intenso no dead line. E assim começou:

1º dia: cama sequinha de manhã, criança e mamães felizes a cantar. Esse foi o assunto que reinou no café da manhã e a Laura não parava de falar sobre o fato, não duvido que tenha contado até para a professora.

2º dia: mais um dia de cama sequinha e eu já começava a respirar - então minha filha seria dessas crianças iluminadas?

3º dia: HA-HA. Acordei e lidei com uma criança tão enxarcada que deu a impressão de que ela fez xixi plantando bananeira na cama. Fiquei irritada e tal, expliquei que ela deveria ter levantado e feito xixi no penico, mas ok né? Acontece.

4º dia: mais xixi e mamãe aqui um pouquinho menos paciente explicando o que ela deveria fazer e quase esquecendo de imprimir na voz aquele tom positivo ideal para uma maternidade saudável.

5º dia: só não tinha mais xixi porque senão faltaria espaço para o cocô. Sim, uma criança que nunca havia feito cocô na calça, que sempre foi um reloginho, desregulou. E a mãe aqui desregulou mais ainda: dei bronca, perdi a paciência, tirei a roupa suja aos puxões e dei um banho com zero amor. Como parecia que ela não se importava, aquilo me frustrava ainda mais. Ridículo eu sei, mas eu sou assim: ridícula e irracional de manhã.

6º dia: cheguei no quarto e vi a cena: lençol e plástico no chão, criança deitada no colchão cheia de xixi... (calma que agora vem a parte difícil)... Cantando. Sim, ela estava cantando. Tarja preta para o meu momento surtado: fiz tudo o que não podia fazer, briguei, gritei, falei sem parar por vários minutos, fiquei de mau humor o resto da manhã, coloquei criança de castigo por ter tirado o plástico, etc. Um horror. Depois desse show matinal, liguei pra Camila que estava no trabalho e desandei a contar tudo e dizer que eu não ia me arrepender de coisa nenhuma, que aquela criança tava fazendo de propósito e que tudo se foda. Cinco minutos depois uma culpa me corroeu fundo e fui bater um papo com uma Laura triste. Falei coisas mais positivas, usei voz calma, olhei no olho, abracei, convidei para brincar... Enfim, o equilíbrio em pessoa.

Material usado: máquina de lavar, vários pijamas, calcinhas e lençóis, grandes doses de irritação.
Recursos adicionais: gritos, broncas e daí para pior. Cheguei a tirá-la da cama uma noite para fazer xixi, mas morri de pena porque ela dorme muito bem. O habitual era reduzir líquidos à noite, mandar fazer xixi antes de dormir e logo ao acordar.
Resultado: começou bem, mas graças à habilidade maternal aqui, o negócio desandou.
Tirada de fralda segunda etapa: fracasso total.

Depois de alguns dias com xixi diário na cama, eu disfarçando a raiva de ter que fazer a cama e lavar tudo todos os dias para não sobrecarregar nossa gostosinha que não tem culpa de ter uma mãe estressada, passamos a considerar outras opções. Em uma conversa com uma amiga que é psicóloga, mãe e super ponderada, contei a novela do desfralde noturno e perguntei se ela achava que seria problemático voltar às fraldas à essa altura da história. A decisão foi tomada depois de eu ouvir a pergunta: "O que você acha que será mais traumático: ela acordar todos os dias vendo você fingir que não se irrita ou voltar a usar fraldinha por um tempo e ter a mamãe feliz de volta?"

Né gente, eu sempre levando os tapas na cara. Fui pra casa decidida a voltar para as fraldas. À noite, na hora de dormir, conversei com ela. Mostrei a fralda e falei que eu a admirava por se esforçar em fazer xixi no penico, e que o xixi na cama não era um problema, que iríamos colocar a fralda de novo e mais tarde tentaríamos mais uma vez. Que isso significava que ela estava crescendo e aprendendo a ser uma criança maiorzinha e que a mamãe estava (cof cof) super feliz com isso. Aplausos.

1º dia de fralda: Laura acorda feliz da vida dizendo que não fez xixi na cama. Te falar? Psicologia infantil não é ciência, é praga rs

A partir desse dia, hoje ela completa 4 dias de retorno às fraldas e além de não fazer um pingo de xixi na cama, também aprendeu a sair da cama e abrir a porta. Não sei ainda quando vamos tirar novamente, mas fica a dica para quem vai passar por isso: escândalos matinais não resolvem.

Resumo da ópera

Por mais que a gente se prepare para o momento; que saiba que essa é uma tarefa simples para nós, mas importantíssima e muito difícil para os pequenos; que saiba que temos que ter muita paciência e amor, criando estímulos para que a criança aprenda a controlar seu xixi; que isso funcione como um trampolim para que a criança se torne mais segura e independente... Por mais que a gente saiba de tudo isso, na hora do vamovê a situação é: você trabalhou até tarde, acordou todos os dias da semana com - além das tarefas habituais - cama molhada, lençol, cobertor, travesseiro, pijama, calcinha, meia e criança para lavar, falou a mesma coisa infinitas vezes e a criança parece ter entendido mas é difícil saber o que realmente entende uma criança de 2 anos. Enfim, você está com frio, cansada e estressada antes de tomar o café da manhã.

Então a grande lição é: não superestime seus poderes de mãe - uma cama molhada ainda pode te derrubar!

Ok, agora a lição verdadeira: o aprendizado no ser humano não é linear, e sim espiral. Aprendemos e desaprendemos a todo o instante e isso é muito fácil de perceber nas crianças, pois elas ainda sabem poucas coisas. Portanto tudo tem que ser incansavelmente repetido e sim, temos que agir de forma positiva, pois eles percebem nosso olhar raivoso e tom de cobrança, sensação horrível que acabam carregando para a vida.

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Enfim nossa!

Hoje, dia 22 de abril de 2013, exatamente 9 meses e dois dias depois de pegarmos a Laura no colo pela primeira vez na vida, podemos encher o peito de orgulho para dizer: ela é nossa!

Tudo começou na quinta-feira passada. Eu havia passado o dia cobrindo evento fora de casa, cheguei exausta, irritada, cheia de trabalhos acumulados. Era 19h quando sentei em frente ao computador e acessei o site do Projudi certa de que mais uma vez entraria lá para ver nada. Mas adoro viver sem expectativas, pois é aí que as boas notícias acontecem: estava lá o documento redigido pela juíza da nossa comarca confirmando o que nosso coração já sabia - Laura é, enfim, nossa filha legítima.

Eu nem consegui terminar de ler o texto e já caí no choro. Nesse momento, nós três ali diante do computador nos amassamos como uma verdadeira família deve fazer. Laura parecia sentir, pois comemorava feliz da vida nos enchendo de beijos - okey, ela comemora qualquer coisa, mas deixa eu acreditar rs.

Fomos hoje ao cartório da Vara da Infância e Juventude para tomar ciência da sentença. Em dez dias teremos a certidão da Laura em mãos. Nos espaços em branco, terá nossos nomes e dos nossos pais como avós de Laura Ribeiro de Souza Fiorio.


Indescritível.

segunda-feira, 15 de abril de 2013

Visita da Dora


No início da semana passada a agenda da escola da Laura veio com um recadinho: "mães, no próximo fim de semana a Laura levará o peixinho para casa". A escola tem essa proposta de que cada fim de semana uma criança leva um peixinho e fica responsável por ele, devolvendo-o na segunda. Só de ouvir falar no assunto já mil argumentos pulam na minha cabeça e o fato é que não, eu não gosto dessa ideia.

Não me entendam mal, eu ADORO peixe. Nós já tivemos 3 peixinhos fofos, sendo que a mais velha, a Kika, ficou conosco por muitos anos, quando morreu eu chorei e fiz luto como acontece com qualquer outro animal de estimação. Eu gosto tanto de peixinhos que não concordo com a ideia de fazer do mesmo um objeto, uma experiência. Aloww, a Laura convive com SEIS animais de estimação! Se é para aprender a respeitar uma vidinha, ter responsabilidades, etc, tudo isso ela aprende x6. Mas ok né? Futuras mamães aí lembrem-se de que a vida tem dessas.

Na sexta-feira, ao buscá-la na escola, veio então o dito cujo - que na verdade é uma dita cuja chamada Dora, uma peixinha beta linda e feliz.



Recebemos a encomenda com aquele nosso mau humor característico. Ainda mais ao constatar que o aquário não tinha tampa e nós temos gatos - um deles bem atentado (corta para a cena de eu dirigindo a 60 km/h na BR e a Cah segurando o aquário que não parava de balançar com a coitada da Dora agitando lá dentro).

Ao chegar em casa, colocamos o pobre ser dentro do armário para passar a noite - isso nos daria tempo para pensar em como cuidar para que ele não fosse devorado nos próximos dois dias. Na mochila dela havia comida, produtos para a água e o Diário do Peixinho. Abri o diário: "Olá! Você está recebendo a visita da Dora! bla bla bla". O texto falava sobre os cuidados e a seguir os pais relatavam a experiência - uma mais incrível e empolgante que a outra (de onde vêm esses pais?). E a gente gostando cada vez mais rs

Respirei fundo e falei: vamos lá, se Laura recebeu essa tarefa, ela vai fazer da melhor forma e pronto. Cah complementou: tira uma foto do peixe, assim se alguém o comer compramos outro igual.

- Vamos dar papá para a Dora filha? Já está na hora do jantar da sua amiguinha! (essa fui eu toda alegria de viver). Abri o pote de ração e...

Derrubei tudo no chão. Bolinhas minúsculas espalhadas pelo quarto, gatos querendo comer tudo, eu sem paciência NE-NHU-MA comecei a resmungar putadavida. Cah riu muito da minha cara.

Corta novamente para a cena de nós ajoelhadas no chão catando bolinhas e colocando no pote. Mas o que para mim começou como uma tarefa super hiper irritante, terminou como sempre termina tudo o que fazemos com a Laura. Ela ajudando a recolher as bolinhas, de repente parou, me deu um baita abraço apertado e falou:

- Mãe, timamu!

Tem como ficar de mau humor??? Hoje, ao devolver a Dora, entreguei também o Diário com um texto bobo-alegre igual ao dos outros pais.